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«Um passo destemido»

Pecados Santos, por Sofia Teixeira, BranMorrighan.

 

É sempre um orgulho quando lemos um autor português de inegável qualidade. Mesmo sendo mais modesto do que devia, Nuno Nepomuceno tem tido um percurso discreto, mas sólido. Começou a sua carreira enquanto autor ganhando um prémio literário, na altura para o primeiro livro da trilogia Freelancer – O Espião Português. Este seria o início de um crescendo constante, de um amadurecer narrativo a olhos vistos e, fechada a trilogia, em 2016 o autor confirmou-se como um mestre do thriller com o seu romance A Célula Adormecida. Os seus leitores são unânimes, Nuno Nepomuceno tornou-se num escritor tão capaz quanto querido para o seu público. Não será então de estranhar o burburinho que se faz sentir desde o início do ano, desde que se soube que viria nova obra – Pecados Santos. Com este escritor nunca nenhum livro é igual/ parecido a outro e a sua capacidade para abordar temas tão diversos quanto interessantes é já uma característica admirável. Entremos neste universo de morte, fé, paixão e traição.

À semelhança do que escrevi na opinião do seu anterior romance, a escrita de Nuno Nepomuceno continua a evoluir e a tornar-se cada vez mais incontornável. O seu trabalho de pesquisa, rigoroso e bem documentado, entra nas suas narrativas de forma suave e extremamente apelativa. Sou suspeita, adoro tudo o que diga respeito a religiões e diferentes formas de fé, mas são poucos os autores que nos conseguem dar autênticas aulas sobre estes assuntos sem os tornarem maçadores. Agora imaginem começar um romance precisamente com uma aula sobre a divisão da linhagem de Abraão, mergulhando mais profundamente no judaísmo. Poderia parecer aborrecido, mas Nuno Nepomuceno teve a mestria de nos conduzir por esse caminho de forma extremamente gráfica e sedutora. O protagonista já é conhecido de quem leu A Célula Adormecida. Afonso Catalão volta a ser o centro da trama. Desta vez, mesmo sem perceber como, vê-se envolvido numa série de crimes aparentemente religiosos que estão ligados, pelo menos em parte, a uma pessoa do seu passado. Pessoa essa que vai desenterrar alguns dos seus demónios mais perturbadores. Afonso não teve uma vida propriamente despida de incidentes e estes voltam a assombrá-lo.

Não é necessário ler qualquer uma das outras obras publicadas anteriormente. Existem alguns cruzamentos de referências – incluindo um sentido de humor hilariante, pois o próprio autor é referido em certo ponto -, mas nada que nos deixe de alguma forma confusos ou perdidos. A estrutura narrativa impele o leitor a ler capítulo após capítulo, sempre com uma imagética bastante poderosa. As descrições são detalhadas e ricas em pormenores que nos transportam para as ruas de Londres, Lisboa e Jerusalém. Existem vários mistérios por desvendar, fazendo com que a nossa mente não pare de se questionar sobre inúmeras possibilidades. As emoções de cada personagem são bem exploradas e as dúvidas permanecem até ao fim. Fim esse que surpreende. Não tanto pelo desvendar do grande mistério, mas antes porque Nuno Nepomuceno dá mais um passo destemido na sua escrita revelando-se capaz de mortes impiedosas e inesperadas, que abrem novas portas para um próximo romance no universo de Afonso Catalão. Tudo é possível. Resumindo: Pecados Santos é uma obra de confirmação deste escritor português que já domina o género thriller em Portugal. Recomendo.»

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